domingo, 26 de abril de 2009

As crianças de hoje (4)

Lidar com o dinheiro

No passado, na nossa fase de criancice, ter na mão uma reluzente moeda dada pelos papás era um grande tesouro. Essas moedas, que não raras vezes eram coleccionadas e recontadas até a exaustão, serviam para comprar o Kurika (revista de banda desenhada), postais, selos, uma ida ao cinema e depois ao Carrocel na feira, um refrigerante e um bolo no Scala ou no Continental.

E as crianças de hoje? Se até bem pouco tempo pediam dinheiro para comprar rebuçados com tatuagem, não tarda muito ou já estão a pedir mola para o seu crédito, para levar a Patricinha (menina rica e mimada) ou a Mariazinha (pobre Maria lá do bairro) ao teatro, depois para lanchar e ainda comprar crédito para esta, isto sem contar “naquelas sapas que toda malta tem menos eu”, etc.

Apesar de todas as adversidades, de uma ou de outra forma, pautamos sempre por poupar algum, pois nunca se sabe o que o futuro nos reserve e nada é eterno. Será que estamos a preparar os nossos filhos para a incerteza da vida? Decerto que sim, guardando sempre que podemos ou com regularidade possivel algum dinheiro para eles na “eventualidade de...”. E o hoje e agora: como gerir?

O nosso salário, infelizmente só é pago uma vez por mês, mas as despesas, essas não param nunca: a todo o momento estamos a pagar algo e até nós mesmos nos questionamos sobre a proveniência do dinheiro para cobrir tanta despesa. E os nossos filhos? Como reagem face ao dinheiro? Como fazê-los rentabilizar o pouco que podemos dar? Dar uma semanada, uma mesada ou sempre que eles dele precisarem?

Muitas vezes, sobretudo no meio escolar, vemos crianças com elevadas quantias em dinheiro vivo. Os pais alegam que é para a garantir a opção de escolha de seus filhos no menu escolar, outros nem sequer justificações apresentam: tem tanto que já não sabem o que fazer senão dá-los aos filhos/crianças com todas as consequeências que dai advém (inveja dos outros, logo furto na carteira dos pais). Preocupação legitima mas errada.

É de salutar pais que se preocupam com o futuro de seus filhos, não só lhes garantindo uma formação como também um pé de meia para a vida futura. Mas se, neste momento, não damos a esses filhos as ferramentas de gestão destes e de outros valores como achamos que eles se portarão face a um bolo relativamente maior e inesperado? Poucos serão os sábios a ponto de o usar da mesma forma que poupam.

A quem diga que quanto mais tardio for o contacto com o dinheiro melhor é para as crianças. Mas, as nossas crianças, desde muito cedo tem contacto com o dinheiro porque vendem ou compram produtos na rua: rebuçados para o “babar” (porque o pai quer sair e o miúdo está aos berros), pão na esquina, crédito (porque é um menino moderno e tem que estar on), alface (porque a menina já sabe preparar a salada), para o chapa, etc.

Dar as crianças um valor para que elas aprendam a geri-lo é saudável para a sua educação económica. No entanto, não podemos cair no erro de fazer parecer que estamos a efectuar um pagamento por serviços ou bom comportamento, essas actividades e postura são obrigações face a familia. Mas como proceder? Dar o dinheiro e deixar o miúdo gerir a seu gosto e vontade? Quando dar? Como dar e com que objectivo? Breve, como ensinar as crianças a lidar com a mola?

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Xeque-mate nas paragens

Em algumas paragens de autocarro e de chapa da cidade, como as conhecidas Electricidade, Ponto Final, Ronil, Entreposto, Laurentina e Alto Maé, grupos de jovem simulam chorudas jogatinas que atraem cidadãos distraídos pelos valores que rodam e que são ganhos: o jogo de cartas denominado Ndjombo (sorte).

A estratégia é, aparentemente, simples mas o processo é complicado. Trata-se de um jogo em que se usam 3 ases de cartas, em que se deve descobrir um dos ases vermelho, o copas ou ouro, entre os ases pretos paus e espada. Portanto, trata-se de uma escolha aleatória por vezes previsivel se se controlar o jogador.

No entanto, tendo em conta a previsibilidade de vitória por parte do apostador, o jogador na verdade faz parte duma vasta team que está por perto, sendo que o isco (apostador que aparentemente ganha nas simulações) é alguém do grupo e até mulheres participam na tramóia.
O apostador-vitima, vendo o suposto apostador-cliente a facturar, desconhecendo as jogadas obscuras e a teia tecida pela team por detrás deste simples aparente jogo de azar, muitas vezes não hesita em tentar a sorte e é ai onde as coisas começam a complicar-se.

As apostas começam baixas e conforme o apostador vai ganhando, as apostas vão subindo. Ao contrário do que o apostador pensa, tudo tem como objectivo único controlar os valores monetários de que este dispõe e alguns membros da team, os olheiros, o vão incitando para que este aumente os lances das apostas.

Quanto maiores os lances, maiores são os riscos que corre o apostador pois num só lance tudo pode ficar perdido. Entretanto, se o apostador após redobrar vitoriosamente as suas apostas decidir pela desistência, alguns dos membros da team o “acompanharão” para recuperar os valores, a pé ou no chapa e... xeque-mate!

sábado, 11 de abril de 2009

Tocaia nas escolas

Há poucos dias, uma sobrinha adolescente veio a minha casa com a camisa do fardamento sem os botões completamente transtornada e lavada em lágrimase mal abri a porta, correu para a casa de banho. Confesso que a primeira impressão foi a de que a miúda havia sido estuprada pelo que, preocupada, fui à casa de banho pois queria saber o que se tinha passado.

Entre lágrimas, disse-me que tinha sido molestada dentro da escola por moços fardados e que aos outros colegas tinham arrancado telemóveis, brincos, sapatilhas, ipod’s e outros objectos de relativo valor. Dentro da escola? Foi a minha questão, ao que ela assentiu positivamente.

Pouco depois, ela veio narrar-me o que se passava na sua escola. No periodo da tarde, jovens estudantes de outras escolas, e não só, entram sala adentro para surripiar tudo o que há de valor. Alguns professores, sobretudo mulheres, preferem abandonar a sala antes do toque com receio do que pode acontecer quase no fim do periodo de aulas.

Inicialmente, esta tocaia era feita à porta da escola, mas com a convivência de alguns alunos da própria escola, uns porque são X9’s (dedo duro) e outros porque são ameaçados pelas gang’s, estes passaram a entrar dentro do recinto escolar e daí para a sala de aula foi apenas um pulo.

Atitudes de género já foram reportadas em escolas de ensino primário de primeiro e segundo graus, mas que já tinham atacado escolas públicas do ensino pré-universitário, está foi a primeira vez e ainda por cima com estratégias de bandidagem tão avançadas.

terça-feira, 7 de abril de 2009

Penteado perigoso

Recentemente desloquei-me, com certa urgência, a um salão de cabelereiro para desmanchar tranças e lavar o cabelo. Logo, tratou-se de um local ao qual não sou cliente assidua com a particularidade de ser unissexo, designação engraçada pelo facto de servir homens e mulheres.

Enquanto esperava que chegasse a minha vez, tive especial cuidado em reparar nos homens que lá estavam ou se dirigiam. A chegada, estava um jovem a fazer um corte com figuras geométricas que exigia algum traquejo do barbeiro e o trabalho final foi espectacular!

Logo de seguida, sentou-se na cadeira da barbearia, um petiz dos seus 5 anos acompanhado pela irmã de aproximadamente 8 anos. Pela aparência da cabeleira do miúdo este parecia-me ter “tinha”. Zum e vrum, em poucos instantes o miúdo ficou completamente careca, o que deixou evidente a primeira imprensão.

Mal o barbeiro varrer a sujeira feita pelos clientes anteriores, entrou na berlinda um senhor de raça branca com alguns fios de cabelo branco. Zum, vrum, aos poucos o cabelo do senhor começou a ser aparado ao seu gosto e... trás, o senhor manda um grito!

Curiosos e aflitos, todos viramo-nos para ver e perceber o que se estava a passar: uma borbulha ou mesmo pele, um pouco mais abaixo da orelha tinha sido esfolada e estava a sangrar. Aflito, o senhor apenas quis um penso rápido para estancar o sangue que escorria.

Mulher prevenida vale por..., abri a minha sacola e saquei um penso para o socorrer. Entretanto, antes de pôr o penso, o barbeiro molhou um pedaço de algodão, usado para retirar verniz, embebeu-o em alcool e passou no ferimento do preocupado cliente que não mugiu e nem tugiu.

De relance olhei para o tal alcool: nem de longe se sentia aquela fragrância forte, com o agravante de ser colorido! O penteado do cliente foi finalizado, o trabalho pago e o barbeiro pegou no mesmo pedaço de algodão já usado, o embebeu com mais um pouco de alcool e limpou a máquina. Pronto, estava esterlizado para o próximo cliente!

A minha urgência perdeu sentido! Retirei-me do salão alegando indisposição pois já era minha vez. Ah, é verdade, eis Tabela de preços da barbearia do referido salão: corte simples: 20,00Mt; corte especial: 45,00Mt; punk: 30,00Mt e juba: 10,00Mt. Agora, Pare e Pense, vale a pena correr o risco de ser contaminado por um preço tão baixo?

sexta-feira, 3 de abril de 2009

"Biznis" no machibombo

Sempre que tenho oportunidade, ao invés de me deslocar de um local para o outro do meu percurso diario, tenho especial preferência pelo autocarro vulgarmente apelidado machibombo, por garantir maior segurança apesar das contrariedades no que concerne aos horários.

Diz um ditado, “cabrito come onde está amarrado” e, tal como em muitas situacoes do nosso quotidano, no machibombo não se foge à regra. Numa dessas idas e vindas, entrei num autocarro apenas porque estava carregada pois estava a três paragens da minha, por sinal a terminal.

O autocarro estava praticamente vazio e ciente de que o percurso não seria longo, o cobrador, ao fazer a venda do bilhete perguntou-se se estava a fazer ligações, por ser hora de ponta, ou se apenas ia até a terminal. Prontamente respondi que ia até a terminal.

O cobrador recebeu o meu dinheiro e até fez os trocos mas não me entregou o bilhete. Já nos aproximavamos da paragem seguinte quando entra uma moça e reparei que também recebeu o mesmo questionamento. Sorte ou azar, esta pretendia fazer ligações.

Chamei o cobrador, pois queria o meu bilhete, comprovativo de que o tinha comprado e que em caso de entrada do revisor custar-me-ia cinquenta vezes um único bilhete. Contrariado o cobrador me passa o bilhete e pede-me que o devolva(?) na minha descida.

Devolver? Questionei surpreendida. Para que efeitos? Apesar de nunca ter trabalhado na transportadora pública de Maputo, sou esclarecida e atenta o suficiente para perceber que quando se chega a uma terminal deve-se assinalar o número de bilhetes vendidos à partir da terminal anterior.

Sem vergonha na cara, o cobrador me responde que “assim poderei revender o bilhete para comprar cigarros!”. Ainda por cima cigarros? Ignorei-o completamente e na minha descida anotei o número telefónico que vem na parte traseira dos machibombos para avaliar se estes são bem ou mal conduzidos e a respectiva matricula.

Qual não foi o meu espanto? Disseram-me que esse tipo de denúncia não era assunto daquela linha e que nem sequer podiam me remeter a uma outra linha pois não existe. Se eu quissesse, deveria ir sede da transportadora para fazer essa denúncia preenchedo o livro de reclamações! Tardiamente descobri que os TPM tem página web...