quarta-feira, 28 de abril de 2010

Estórias em Maputo (20)

As jovens empreendedoras, algumas mal sucedidas em negócios na terra do samba; outras cansadas de se degladiarem com os porteiros de Ressano Garcia, Goba e do aeroporto [haja fôlego !] ; algumas com boutiques e salões de beleza, mas com outros horizontes mais na mente ; outras ainda, com pose de boneca em escritórios da praça, procuram, como todo moza que se preze, formas de aumentar o seu budget.

Ora, visto que o negócio inesgotável e de lucro imediato, após o ramo alimenticio, é o do vestuário, acessórios e cosméticos, as manas dia-a-dia empenham-se mais. Infelizmente, como muitas vezes os valores demandados para muitos desses produtos estão aquém do bolso de muita gente, e as manas, inspiradas pelo advento do empreendedorismo, avançaram para outras modalidades.

Em grupos de 2, 3 ou 4, as manas juntam-se e compram igual número de fardos de roupa (blusas, calças, camisas, saias, etc.) e dividem entre si contribuindo, desse modo, para que possam vender as peças de roupa aos pares. Assim, ao invés de venderem só blusas, combinam blusas com calças, camisas com calças, saias com blusas, vestidos com casacos, por aí em diante.

As manas que não dispõem de muito dinheiro para compras em grupo, vão ao dzudza, no Xipamanine ou Compone. Estas, tal como as manas em grupo, facilitam a vida de muita dondoca, pois para gaúdio das últimas, que afirmam que não txuna da xicalamidade, as manas vasculham e sacodem ; seleccionam e escolhem ; discutem e pechincham. No final das compras, ainda lavam, softam e engomam os txunes.

Passado que é este estágio, as manas pegam no télélé e fazem contactos para a lista VIP, geralmente de pessoas com dívida, pois quanto maior fôr melhor, informando que “já tenho uma blusa verde que combina com aquelas calças que ainda não pagaste". Mediante resposta da cliente devedora ou não, afinal tako só no fim do mês, pacientemente as manas chamam acabam chamando toda a lista de clientes de A à Z.

De seguida, sem stress, ou a paciência não é a chave da alegria, as manas metem-se no chapa, sobem e descem prédios (com ou sem elevador), adentram casas, escritórios, ministérios, centros de saúde, barracas, etc. Até a ausência do boss é aproveitada para transformar o place em passarele… Ah, é verdade, algumas funcionárias, públicas ou privadas, que aproveitam o fim-de-semana para fazer um tour nos dumbas, também entraram no negócio. E ainda dizem que turbismo é bizni de professores, ah !

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Bassopa*!

Não importa se é simples ou conhecido médico, jurista, jornalista, actor, futebolista, etc. ou se faz, de passagem, parte da emergente socialite moçambicana : nos últimos tempos, qualquer um, desde que seja relativamente conhecido, por via dos mass media, corre o risco de, ao ser apanhado com a mão no coiso ou com o coiso na mão, ver tal situação reportada em altas paragonas de alguns programas televisivos.

Engana-se quem pensam que vai, de hoje em diante, tal como fazem algumas estrelas hollywodianas de ser alvo de perseguição de conhecidos papparazis, antes fosse ! Hoje, qualquer cidadão portador de um telemóvel com capacidade para fotografar ou filmar é potencial papparazi. Que o digam alguns alvos desses neopapparazis em pleno acto de compra de bens no dumba-nengue ou em baladas nocturnas que agitam Maputo.

Incentivados por um programa televisivo que, sob patrocínio duma operadora de renome nacional e internacional, a julgar pelas premiações de que se orgulha, literalmente afirma que "paga por pôr os outros na lama" sem sequer se preocupar com as consequências dessa exposição de figuras públicas e das que com quem são geralmente apanhados nesse enredo.

Alvo de comentários mordazes, do tipo "se a dama não é dele ou se ele não é namorado dela, o bicho vai pegar lá em casa", ao analisar, pelo grau de comentários em aglomerações matinais (na paragem de e em autocarros ou chapas), a desgraça de outrém parece agradar a muitos que não vêem a hora de serem abonados com imagens similares para também lucrarem algum. Quanto é, ninguém sabe, mas lucro fácil, quem não gosta ? Bassopa, andar fora é maningue arriscado!

*Cuidado !

PS : Consta que, em manifestação de repúdio aos comentários depreciativos no referido programa, onde o apresentador reconheceu que também se txuna, apesar de serem compras efectuadas pelo seu puto e pela sua prima, um grupo de artistas da praça, liderados pelo instrospectudo Pedro Muiambo, vão proceder a uma passeata de artistas, no Xipamanine, com o lema «Humildade não é defeito – artista compra no dumba-nengue».

terça-feira, 20 de abril de 2010

Último desejo

Júlia é uma compatriota moçambicana, quis o destino, averso como só ele sabe ser, violada, há tempos idos, por 8 homens, no bairro do Zimpeto. Sim, 8 homens tarados, com mente maquiavélica, perversa e diabólica, que decerto vivem na maior paz e tranquilidade com a sua própria consciência quanto a esse feito.

Quis o destino, sempre ele, que desse acto impiedoso, sem desculpa, sem tamanho, breve, com uma infinidade de adjectivos revoltantes, Júlia contrai-se o vírus do HIV. Apesar de ser do conhecimento de “quem de direito”, de nenhuma forma Júlia foi ressarcida por acto tão barbaro moral, psicológico ou mesmo financeiramente.

Vivendo da boa vontade da irmã, sem energia para qualquer outra luta, Júlia vive o dilema de não ter uma casa onde deixar seus filhos menores pois bate-se com sua própria progenitora por um espaço que em principio crê ser seu. Este cenário é realmente sui generis numa das relações mais sólidas da Humanidade que é entre mãe e filho.

Consciente de que os seus dias nesta terra estão em número finito, devido ao seu debilitado estado de saúde, na última volta da corrida que está a perder, como último desejo, Júlia implora que alguma alma caridosa ou instituição ofereça um tecto para albergar os seus petizes quando ela não mais os poder guardar debaixo do seu olhar...

sábado, 3 de abril de 2010

Estórias em Maputo (19)

Txilar ou curtir com a malta é palavra de ordem de muita gente, sobretudo da juventude, à porta dos fins-de-semana e no próprio fim-de-semana. Formas de diversão são inúmeras mas os pontos comuns desse excitante cocktail são o alcool, a música e, algumas vezes, as orgias na traseira dos carros ao olhos de quem está próximo e que até aplaude as performances desse cinema gratuito e bizarro.

Fatalmente, os txilanços dos últimos tempos, obrigam a que os txila’s tenham tako no bolso e viatura (com ou sem o consentimento dos pais ou nem por isso), basta o tanque estar cheio, com o patrocínio dos bradas, evidentemente, para se deslocarem para os locais onde está a bater, de preferência com potentes «sabufas» para dar mais raiva aos outros manos e atrair as dengosas damas que rebolam sensualmente.

Os locais de concentração são conhecidos de todos os txila’s, com a magia dos telemóveis, em poucos minutos, diante de um coleman recheado de todas as apetecíveis geladinhas (também com um verão como este que nunca mais acaba !), duma simples barraca ou dum contentor de bebidas, se aglomera uma ruidosa multidao e a ela vão se juntado outros grupos e… tá-se a txilar, tá a bater !

Os mais prudentes cedo retomam a casa. Outros, por falta de meios automobilísticos e/ou de condições para pagar um taxi, que no frescor da madrugada supreendentemente duplicam de preço, recorrem aos serviços de taxi oferecidos pelas carrinhas de caixa aberta das empresas de segurança que efectuam «patrulhas» em residências próximas. Esfomeados que são, os securites, pela modéstia quantia de 50 paus, transportam mais do que dois txila's, alguns até com direito a entrega ao domicílio.

No final do txiling, no meio de toda imundície provocada pelos txila’s (garrafas e latas onde são, muitas vezes, acondicionados os liquídos rejeitados pelo organismo) os txila’s ao extremo, em condições deploráveis (nessa hora as mulheres perdem toda a pose e os homens até esquecem-se dos seus próprios nomes), assistem ao nascer do dia sob o olhar crítico de todos lúcidos que por lá passam.